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Suaves Brutalidades
Ao explorar dissemelhantes expressões artísticas, Henrique Montagne lança-se ao risco rumo a uma alargada possibilidade de linguagens que, observadas em conjunto, podem ser compreendidas como uma incomum poética visual, cujo assunto central está nas abordagens do corpo, das suas identidades e subjetivações, mas não apenas. Podemos perceber uma explanação de uma solidão angustiante generalizada tão indissociável das sociedades de consumo e das suas tecnologias, onde as próprias relações estão atravessadas pela lógica capitalista dos prazeres efêmeros, descartáveis, das vivências fugazes, dos afetos momentâneos, de amores fugidios.
O artista nos direciona para distintas versões de si ao apresentar ora autobiografias ficcionalizadas, ora representações alegóricas de desejos íntimos fidedignos ou imaginados, os quais confirmam e, ao mesmo tempo, denunciam as construções simbólicas tão flagrantes numa cultura cisheterocentrada e masculinista. Através da intersecção entre a performance, o vídeo, a fotografia, a pintura, o desenho, a instalação, o objeto e a escrita, “Suaves Brutalidades” traz à luz o modo como a globalização produz e sujeita a configuração daquilo que entendemos como masculino por meio de uma ampla circulação de imagens de corpos e modelos de masculinidades numa era cibernética, comentando os arquétipos corpóreos massivamente difundidos, codificados e incorporados, bem como as inevitáveis desilusões decorrentes das desmedidas exigências impostas pelos fantasiosos constructos hegemônicos nas suas práticas de governo sobre os corpos.
Afinal, a semântica da violência estrutura o imaginário sobre a masculinidade não apenas pela difusão de corpos viris associados a um vigor absoluto, mas também pela frustração que ela gera inclusive nos indivíduos que habitam o lugar da masculinidade, porque ela é utópica e ninguém a cumpre em sua totalidade.
E ainda que seja flagrante a híper-exposição de desejos aprisionados às construções admitidas numa cultura disciplinada por convenções corpóreas, elas não são submissas às moralidades tão típicas de um poder disposto a censurar tudo o que não se encaixa em suas regras tão castradoras. “Suaves Brutalidades” propõe uma tensão ininterrupta, um constante curto-circuito entre a tecnologia analógica e digital, entre o revival e o atual, entre o táctil/factível e a virtualidade, entre a ternura, a delicadeza e a violência.
Tales Frey
Texto Curatorial da exposição 'Suaves Brutalidades'
2021
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